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sábado, 27 de junho de 2009

AO ANOITECER


Sou um velho rato celibatário
- a lei não me permite casamento.

outros encontram sem dificuldade
o universo pronto a vestir

logo de manhã, desde que nasceram
Depois trajam todas as convenções

- Que lhes assentam bem, do colarinho
às mangas, até parece que Deus

é um alfaiate pr conta deles.
A nós a melhor roupa fica mal

- em nenhuma loja vendem apatos
que nos deixem ir noutra direcção,

nem anel que não faça propaganda
à ordem empre «natural» do mundo.

José António Almeida
"O Casamento Sempre foi Gay
E Nunca Triste"

Livros & etc, 2009.

domingo, 12 de abril de 2009

HÁ MAIS UMA ESTRELA NO CÉU


Acabo de saber pelo Felizes e pelo Pinguim da partida do Catatau. Confesso que foi um choque.
Há muito que sentia a falta dos seus comentários, sempre me interroguei como é que ele conseguia, quase sempre, ser o primeiro a comentar, e como eram sempre certeiros e pertinentes esses mesmos comentários. Não o vou poder abraçar no jantar deste ano e já sinto saudade.

Este foi daqueles que nunca esqueci:

"Olha, nem sabes a alegria que me dás!
Não, não é por quereres tirar um curso superior (que sim, pronto, ok, mas não é isso) - é por ser o curso que é!!! Vais gostar, acredita. E se não o conseguires fazer no tempo "regulamentar", demora o que quiseres. Saboreia-o.

(Se precisares de ajuda pede o meu contacto ao Pinguim. :) )"
8 de Maio de 2008 08:35


Aqui fica a minha homenagem nas palavras do Al Berto, penso que ele iria gostar.

"No centro da cidade, um grito. Nele morrerei, escrevendo o que a vida me deixar. E sei que cada palavra escrita é um dardo envenenado, tem a dimensão de um túmulo, e todos os teus gestos são uma sinalização em direcção à morte - embora seja sempre absurdo morrer.
Mas hoje, ainda longe daquele grito, sento-me na fímbria do mar. Medito no meu regresso. Possuo para sempre tudo o que perdi. E uma abelha pousa no azul do lí­rio, e no cardo que sobreviveu à geada. Penso em ti. Bebo, fumo, mantenho-me atento, absorto - aqui sentado, junto à janela fechada. Ouço-te ciciar amo-te pela primeira vez, e na ténue luminosidade que se recolhe ao horizonte acaba o corpo. Recolho o mel, guardo a alegria, e digo-te baixinho: «Apaga as estrelas, vem dormir comigo no esplendor da noite do mundo que nos foge»."

Al Berto, Lunário

Imagem: Starry Night - Van Gogh

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

ANTÍNOO


Era em Adriano fria a chuva fora

Jaz morto o jovem
No raso leito, e sobre o seu desnudo todo,
Aos olhos de Adriano, cuja cor é medo,
A umbrosa luz do eclipse-morte era difusa

Jaz morto o jovem, e o dia semelhava noite lá fora
A chuva cai como um exausto alarme
Da Natureza em acto de matá-lo.
Memória do que el´ foi não dava já deleite,
Deleite no que el´ foi era morto e indistinto.

Oh mãos que já apertaram as de Adriano quentes,
Cuja frieza agora as sente frias!
Oh cabelo antes preso p´lo penteado justo!
Oh olhos algo inquietantemente ousados!
Oh simples macho corpo feminino
qual o aparentar-se um Deus à humanidade!
Oh lábios cujo abrir vermelho titilava
os sítios da luxúria com tanta arte viva!
Oh dedos que hábeis eram no de não ser dito!
Oh língua que na língua o sangue audaz tornava!
Oh regência total do entronizado cio
Na suspensão dispersa da consciência em fúria!
Estas coisas que não mais serão.
A chuva é silenciosa, e o Imperador descai ao pé do leito.
A sua dor é fúria,
Porque levam os deuses a vida que dão
e a beleza destroem que fizeram viva.
Chora e sabe que as épocas futuras o fitam do âmago do vir a ser;
O seu amor está num palco universal;
Mil olhos não nascidos choram-lhe a miséria.

Antínoo é morto, é morto para sempre,
É morto para sempre, e os amor´s todos gemem.
A própria Vénus, que de Adónis foi amante,
Ao vê-lo então revivo, ora morto de novo,
Empresta renovada a sua antiga mágoa
Para que seja unida à dor de Adriano.

Agora Apolo é triste porque o roubador
Do corpo branco seu ´stá para sempre frio.
Não beijos cuidadosos na mamílea ponta
Sobre o pulsar silente lhe restauram
Sua vida que abra os olhos e a presença sinta
Dela por veias ter o reduto do amor.
Nenhum de seu calor, calor alheio exige.
Agora as suas mãos não mais sob a cabeça
Atadas, dando tudo menos mãos,
Ao projectado corpo mãos imploram.

A chuva cai, e el´ jaz
como alguém que de seu amor ´squeceu todos os gestos
E jaz desperto à espera que regressem quentes.
Suas artes e brincos ora são c´o a Morte.
Humano gelo é este sem calor que o mova;
Estas cinzas de um lume não chama há que acenda.

Que ora será, Adriano, a tua vida fria ?
Quão vale ser senhor dos homens e das coisas ?
Sobre o teu império a ausência dele desce como a noite.
Nem há manhã na esp´rança de um deleite novo;
Ora de amor e beijos viúvas são as tuas noites;
Ora os dias privados de a noite esperar;
Ora os teus lábios não têm fito em gozos,
Dados ao nome só que a Morte casa
À solidão e à mágoa e ao temor

Tuas mãos tacteiam vagas alegria em fuga
Ouvir que a chuva cessa ergue-te a cabeça,
E o teu relance pousa no amorável jovem.
Desnudo el´ jaz no memorado leito;
Por sua própria mão el´ descoberto jaz.
Aí saciar cumpria-lhe teu senso frouxo,
Insaciá-lo, mais saciando-o, irritá-lo
Com nova insaciedade até sangrar teu senso.

Suas boca e mãos os jogos de repôr sabiam
Desejos que seguir te doía a exausta espinha.
Às vezes parecia-te vazio tudo
A cada novo arranco de chupado cio.
Então novos caprichos convocava ainda
À de teus nervos, carne, e tombavas, tremias
Nos teus coxins, o imo sentido aquietado.



Fernando Pessoa (excerto)
Traduzido por Jorge de Sena a partir do original em inglês

quinta-feira, 3 de julho de 2008

O FALO



Falo
De ti
Falo
Mole
Em fole
Triste

Falo
De ti
Falo
Torto
Morto
Que dás dó
Falo
Louco
Viste
O gozo
Riste
Doido
E não só
Falo
Em riste
Querido
Vivo
Grito
Entra

Falo
Hirto
Fá-lo
Louco
Nosso gozo
E tão só

Nhári Viana


Falo
Distante
Ausente
Presente
Sempre o falo
De que falo fá-lo

Cresce
Acresce
Robustece
Endurece
Oferece-se
Enterra-se
(em mim)
Chora, cede
E adormece

O falo de que falo fá-lo

Nhári Viana


Momento pedagógico:



Meus amigos, isto não é nenhuma brincadeira maliciosa em photoshop. É apenas um simples cogumelo.

Em micologia o Phallus Impudicus é o nome científico de a uma espécie de cogumelo muito comum na América do Norte e na Europa (Portugal incluído).

Este fungo, é conhecido pela sua forma fálica e pelo cheiro nauseabundo. Tal facto não o impede de ser comestível e de sabor bastante apreciado ;)

segunda-feira, 23 de junho de 2008

S. JOÃO


Quero mandar um grande abraço aos meus amigos da "inbicta" e desejar-lhes uma grande noite de S. João.
Este poema do Botto é dedicado a todos vocês.


Aguarela Sombria (excerto)

A tarde vem
Num desfolhar de pétalas cinzentas
E amarelas e lilases-
E as raparigas em coro
- Raparigas e rapazes,
No terreiro da ermida,
Bailam suspiram e cantam
Envolvidos na ilusão
De que a vida é uma cantiga.

São João anda na roda!

Tenho um craveiro no peito
Que dá cravos todo o ano;
Só os dou ao mneu amor
Se ele me der um desengano.

Aos abraços vou dançando-
Mas sem deixar de fixar
Os olhos da cantadeira,
Vermelha, fresca, sadia,
Como castelo vermelho
De uma linda melancia!...
Sobem foguetes. As bocas e os corações
Vibram atafulhadinhos
De sonhos e promessas.
E até os corpos incharam
No desejo de beijar...

António Botto
"Canções e Outros Poemas"
Edição, cronologia e introdução de Eduardo Pitta

THE RIME OF THE ANCIENT MARINER


The fair breeze blew, the white foam flew
The furrow folloewd free;
We were the first that ever burst
into that silent sea!

Down dropt the breeze, the sails dropt down,
'Twas sad as sad could be;
And we did speak only to break
The silence of the sea!

All in a hot and copper sky,
The bloody Sun, at noon,
Right up above the mast did stand,
No bigger than the Moon.

Day after day, day after day,
We stuck, nor breath nor motion;
As idle as a painted ship
Upon a painted ocean.
Water, water, every where,
And all the boards did shrink;
Water, water, every where,
Nor any drop to drink.



Soprava a suave brisa,
A branca espuma ondeava,
Calmo era o sulco, e extenso;
Ninguém antes tinha entrado,
naquele mar de silêncio.

A brisa e as velas caíram,
Oh, que tristeza sem par;
Falámos só para romper
O silêncio do mar!

Num céu quente e cobreado,
O Sol sangrento, ao meio-dia,
A pino por sobre o mastro,
Não era maior que a Lua.

Dia a dia, dia a dia,
Sem um sopro que o movesse,
O barco ficou parado;
Em vão como um barco a tinta
Num oceano pintado.

Água, água, em todo o lado,
E as pranchas a encolher;
Água, água, em todo o lado,
E nem uma gota para beber.

The Rime of the Ancient Mariner
Samuel Taylor Coleridge (1772-1834)
Ilustrações: Gustave Doré (1832-1883)
Tradução portuguesa: Gualter Cunha, Relógio de Água


Foi há um ano atrás que eu fiz referência a este livro aqui no blogue. Ainda na ressaca do concerto de Metallica e já na antecipação dos Iron Maiden trago aqui um excerto deste grandioso poema de Coleridge, apenas um dos grandes escritores britânicos que eu conheci através da música dos Maiden. Um dia talvez traga até aqui o Edgar Allan Poe com "Murders in the Rue Morgue" dos Iron Maiden a acompanhar. Pode ser que também encontre mais algumas destas fabulosas ilustrações do Doré para embelezar o post.

sábado, 14 de junho de 2008

MARAVILHAS DA TERRA ONDE NASCI

Baía de Luanda

Palanca negra (Hippotragus niger)


Welwitschia mirabilis, Deserto do Namibe

Embondeiro



Os rios atónitos

(Ouvindo "Kongo", por Miriam Makeba)

Há palavras a dormir sobre o seu largo
assombro
Por exemplo, se dizes Quanza ou dizes Congo
é como se houvesse pronunciado os próprios
rios
Ou seja, as águas
pesadas de lama, os peixes todos e os perigos
inumeráveis
O musgo das margens, o escuro
mistério em movimento.

Dizes Quanza ou dizes Congo e um rio corre
Lento
em tua boca.

Dizes Quanza
e o ar se preenche de perfumes perplexos.

E dizes Congo
e onde o dizes há grandes aves
e súbitos sons redondos e convexos.

E dizes Quanza, ou dizes Congo
e sempre que o dizes acorda em torno
um turbilhão de águas:
a vida, em seu inteiro e infinito assombro.


José Eduardo Agualusa

sexta-feira, 13 de junho de 2008

QUISESSES


Quisesses tu falar-me do que eu sinto
quando me vens à noite encher de sonho
Só com a tua presença?!

António Botto

segunda-feira, 2 de junho de 2008

CANÇÃO DE AMOR


Ensinei o meu pénis a dizer
o teu nome. Só ele é capaz

de soletrá-lo de trás para a
frente e da frente para trás

indiferentemente

Só ele fala como falo

Jorge Sousa Braga
"O Poeta Nu"

sexta-feira, 30 de maio de 2008

CANÇÃO


Este esperma é puro
como a água de um iceberg

Colhido por masturbação
centrifugado capacitado...

Bebe deste esperma simples
ou com gelo e limão

Só assim conseguirás
a redenção
Jorge Sousa Braga
"A Ferida Aberta"

segunda-feira, 26 de maio de 2008

LUA CHEIA



Lua cheia:
com esta moeda de oiro
posso comprar um sorriso

Jorge Sousa Braga

quarta-feira, 21 de maio de 2008

AOS ESTUDANTES PORTUGUESES


Fado Despedida do 5º Ano Juridico

Neste Maio de revoltas estudantis, uma palavra para todos aqueles que se rebelaram contra o sistema vigente e lutaram por um mundo um pouquinho melhor:

Aos jovens da greve académica de 1907 que deram mais um abanão numa monarquia já em avaçado estado de decadência.

Aos jovens da década de sessenta que durante as várias crises de 1962, 65 e 69 abalaram um regime cinzento e fizeram mexer a cinzenta sociedade portuguesa.

Aos jovens da "geração rasca" que combateram a Ministra Ferreira Leite e ousaram mostrar o rabo ao Grilo. Quantos de vocês que me lêm eram estudantes naquela altura?
Para todos eles as

FLORES PARA COIMBRA

"Que mil flores desabrochem. Que mil flores
(outras nenhumas) onde amores fenecem
que mil flores floresçam onde só dores
florescem.

Que mil flores desabrochem. Que mil espadas
(outras nenhumas não)
onde mil flores com espadas são cortadas
que mil espadas floresçam em cada mão.

Que mil espadas floresçam
onde só penas são.
Antes que amores feneçam
que mil flores desabrochem. E outras nenhumas não."


Manuel Alegre
Flores para Coimbra

quinta-feira, 1 de maio de 2008

CANÇÃO DE AMOR


Ensinei o meu pénis a dizer
o teu nome. Só ele é capaz

de soletrá-lo de trás para a
frente e da frente para trás

indiferentemente

Só ele fala como falo

Jorge Sousa Braga
"O Poeta nu"

Eu sei que não é o post mais indicado para o Dia da Criança mas não tive imaginação para mais.

domingo, 13 de abril de 2008

O BEIJO

Sabiam que hoje, 13 de Abril, é o Dia do Beijo?

Entras como um punhal
até à minha vida.
Rasgas de estrelas e de sal
a carne da ferida.

Instala-te nas minas.
Dinamita e devora.
Porque quem assassinas
é um monstro de lágrimas que adora.

Dá-me um beijo ou a morte.
Anda. Avança.
Deixa lá a esperança
para quem a suporte.

Mas o mar e os montes…
isso, sim.
Não te amedrontes.
Atira-os sobre mim.

Atira-os de espada.
Porque ficas vencida
ou desta minha vida
não fica nada.

Mar e montes teus beijos, meu amor,
sobre os meus férreos dentes.
Mar e montes esperados com terror
de que te ausentes.
Mar e montes teus beijos, meu amor!…

Fernando Echevarria


Ai, como eu te queria toda de violetas
E flébil de cetim…
Teus dedos longos, de marfim,
Que os sombreassem jóias pretas…E tão febril e delicada
Que não pudesses dar um passo -
Sonhando estrelas, trantornada,
Com estampas de cor no regaço…

Queria-te nua e friorenta,
Aconchegando-te em zibelinas -
Sonolenta,
Ruiva de éteres e morfinas…

Ah! que as tuas nostalgias, fossem guizos de prata -
Teus frenesis, lanjoulas;
E os ócios em que estiolas,
Luar que se desbarata…

………………………………………………………………..

Teus beijos, queria-os de Tule,
Transparecendo carmim -
Os teus espasmos de seda…

- Água fria e clara numa noite azul,
Água, devia ser o teu amor por mim…

Mário de Sá-Carneiro





Quanto, quanto me queres? - perguntaste
Numa voz de lamento diluída;
E quando nos meus olhos demoraste
A luz dos teus senti a luz da vida.

Nas tuas mãos as minhas apertaste;
Lá fora da luz do Sol já combalida
Era um sorriso aberto num contraste
Com a sombra da posse proibida...

Beijámo-nos, então, a latejar
No infinito e pálido vaivém
Dos corpos que se entregam sem pensar...

Não perguntes, não sei - não sei dizer:
Um grande amor só se avalia bem
Depois de se perder.

António Botto

Tu choravas e eu ia apagando
com os meus beijos os rastos das tuas lágrimas
– riscos na areia mole e quente do teu rosto.
Choravas como quem se procura.
E eu descobria mundos, inventava nomes,
enquanto ia espremendo com as mãos
o meu sangue todo no teu sangue.
Não sei se o mundo existia e nós existíamos realmente.
Sei que tudo estava suspenso,
esperando não sei que grave acontecimento,
e que milhares de insectos paravam e zumbiam nos
meus sentidos.
Só a minha boca era uma abelha inquieta
percorrendo e picando o teu corpo de beijos.
Depois só dei pela manhã,
a manhã atrevida
entrando devagar, muito devagar e acordando-me.
Desviei os meus olhos para ti :
ao longo do teu corpo morriam as estrelas.
A noite partira. E, lentamente,
o sol rompeu no céu da tua boca.

Albano Martins

Teus olhos, borboletas de ouro, ardentes
Borboletas de sol, de asas magoadas,
Pousam nos meus, suaves e cansadas
Como em dois lírios roxos e dolentes…

E os lírios fecham… Meu amor não sentes?
Minha boca tem rosas desmaiadas,
E as minhas pobres mãos são maceradas
Como vagas saudades de doentes…

O silêncio abre as mãos… entorna rosas…
Andam no ar carícias vaporosas
Como pálidas sedas, arrastando…

E a tua boca rubra ao pé da minha
É na suavidade da tardinha.
Um coração ardente palpitando…

Florbela Espanca


Um rapaz beijou-me ontem à tarde
E o seu beijo era um vinho perfumado
Tão longamente bebi nesses lábios o vinho do amor
que ainda agora me sinto embriagada.

Anónimo - Grécia (séc. I a.c.)
Trad. Jorge Sousa Braga




Morrer de amor
ao pé da tua boca


Desfalecer
à pele
do sorriso


Sufocar
de prazer
com o teu corpo


Trocar tudo por ti
se for preciso


Maria Teresa Horta

UM BEIJO A TODOS.

sábado, 12 de abril de 2008

VIA LÁCTEA


Segundo dados da organização Mundial
De Saúde... praticam-se diariamente

Cem milhões de cópulas em todo
O mundo... das quais resultam

Mais ou menos trezentos mil
Litros de esperma... isto sem

Contar com o produto das actividades
Solitárias e das poluções nocturnas

Jorge Sousa Braga
A Ferida Aberta

quarta-feira, 9 de abril de 2008

MADRIGAL Á CIBDÁ DE SANTIAGO


Chove en Santiago
meu doce amor.
Camelia branca do ar
brila entebrecida ô sol.

Chove en Santiago
na noite escrura.
Herbas de prata e de sono
cobren a valeira lúa.

Olla a choiva pola rúa,
laio de pedra e cristal.
Olla o vento esvaído
soma e cinza do teu mar.

Soma e cinza do teu mar
Santiago, lonxe do sol.
Agoa da mañán anterga
trema no meu corazón.

Federico Garcia Lorca
Música: "Chove en Santiago"
Luar na Lubre
"Cabo do Mundo", 1999

terça-feira, 25 de março de 2008

SEIS HORAS TRÊS MINUTOS



Seis horas três minutos

no rico reino dos ondatras
sobre os campos da batalha sob o aparente reinado
da massa
o dedo trémulo de uma criança
luta contra a dor silenciosa de sempre
subindo às maiores alturas
novos e estranhos náufragos em gozo de licença
quatro homens
que olham
enquanto
por todos os lados
quatro cadáveres
passam


Mário Cesariny

"Pena capital"

Imagem: Sara Franco

sábado, 22 de março de 2008

CANTIGA DE AMIGO E DE AMADO


Ca morreu o meu amigo
o que surrealista migo
na escurana da manhã,
ca morreu o meu amigo
por todolo bem que fez consigo
vou pôr outro Dolviran.

Ca morreu o meu amado,
o que se fazia no prado
sobre las terras da louçã,
ca morreu o meu amado,
pelo sabor que me ha cobrado
vou pôr outro Dolviran

Ca morreu trigoso e gentil
e não mais irá a fossado
nem de seu elmo constelado
terá nome Alexandre O'Neill
ca morreu má hora e mau grado,
em as ondas do mar quebrado
vou pôr outro Deprimil

E s' dormiu, o de corpo delgado,
sob'lo pano mais fraguado
que todolos que possam estar
nessa côrte que não tem lado,
em o quarto mais retirado
o seu sopro quero catar

E se lá secam as delgadas
e as aljavas deslustradas
que gostosa eu lavava aqui,
não mais serei destas estradas
e destas terras desterradas
irei pôr o Dolviran i.

Mário Cesariny
"Pena Capital"
Foto: David Morgan

quarta-feira, 19 de março de 2008

PAIXÃO NUA


A paixão nua e cega dos estios
Atravessou a minha vida como rios

Sophia de Mello Breyner Andresen
"O Nome das Coisas"
Imagem: Phosphorus and Hesperus, Evelyn De Morgan

terça-feira, 4 de março de 2008

MORRA O BISPO E MORRA O PAPA


Este poema é dedicado aos bispos espanhóis, a D. José Policarpo e ao Bentinho

Morra o bispo e morra o papa.
maila sua clerezia.
Ai rosas de leite e sangue.
que só a terra bebia!
Morram frades, morram freiras.
maila sua virgaria.
Ai rosas de sangue e leite.
que só a terra bebia!
Morra o rei e morra o conde.
maila toda fidalgula.
Ai rosas de leite e sangue.
que só a terra bebia!
Morram meirinho e carrasco.
maila má judicaria.
Ai rosas de sangue e leite.
que só a terra bebia!
Morra quem compra e quem vende,
maila toda a usuraria.
Ai rosas de leite e sangue.
que só a terra bebia!
Morram pais e morram filhos.
maila toda filharia.
Ai rosas de sangue e leite.
que só a terra bebia!
Morram marido e mulher.
maila casamentaria.
Ai rosas de leite e sangue,
que só a terra bebia!
Morra amigo, morra amante.
mailo amor que se perdia.
Ai rosas de sangue e leite,
que só a terra bebia!
Morra tudo, minha gente.
vivam povo e rebeldia.
Ai rosas de leite e sangue.
que só a terra bebia!

Jorge de Sena